LL: Pai, o que significa ´cotidiano`?
DD: Onde você viu essa palavra?
LL: No livro de português.
DD: Cotidiano significa aquilo que acontece todos os dias, diariamente. É o que a gente faz regularmente no dia-a-dia. Dê um exemplo de algo cotidiano seu.
LL: Hummm... Deixa eu ver... Ir pra escola é cotidiano.
DD: Isso. Todo dia, de segunda a sexta você vai para o colégio. Cotidianamente nós estamos aqui por volta das seis e dez, seis quinze da matina, na entrada de casa esperando a van pra te levar pro colégio. Você mesma já observou que todo dia quando a gente chega aqui no portão, tem uma mulher que passa em frente daqui de casa pra fazer caminhada. Olha lá, aquele pombo em cima do fio da rede elétrica, que ontem quase dava uma cagada em nossas cabeças sem a gente perceber, ele parece que cotidianamente pousa no fio da rede elétrica. Daqui a pouco começa a passar gente para ir trabalhar, tanto de carro como a pé, cotidianamente.
LL: E aquele avião a jacto que tá passando ali – apontou pro céu – ele também é cotidiano?
DD: Não, porque não o vimos todos os dias passar ali. O Lula todos os dias aparecer na televisão falando, é um cotidiano que enche o saco.
LL: O bebê que chora e faz cocô também é um cotidiano.
DD: É sim. O Obama aparecer todos os dias nos noticiários televisivos é algo cotidiano politicamente no mundo inteiro; os crimes que aparecem todos os dias na televisão é uma coisa cotidiana muito triste; O Ronaldo Fenômeno aparecer todo dia na televisão por causa de seus dois gols no Corinthians, é um cotidiano idiota;
LL: Fazer os deveres da escola...
DD: Não, não, isso não é um cotidiano idiota, não. É um cotidiano essencial... Sim, é verdade, tem momento que a gente acha um saco fazer dever de casa, porque brincar é infinitamente mais legal. Mas que é importante pra gente, ah, isso é. (Se eu tivesse a idade dela agora, vivendo essa fase da infância, iria me contestar, com certeza).
LL: Lá vem a van da escola, pai. Conheci pelo barulho dela. (Me beijou e atravessou a rua tranqüila).
DD: Tchau, filha, o cotidiano da vida te chama. Dê um beijo pra professora cotidiana; um abraço no porteiro cotidiano; um bom-dia pro motorista da van cotidiano; um olhar de admiração pro Sol cotidiano; um olhar de compaixão pros mendigos cotidianos deitados nas calçadas lá da W3 Sul; um insistente raciocínio pra aquela expressão de matemática que lhe encheu a paciência; (Ela já não mais me ouvia mas fez aquele sinal tradicional dos metaleiros, com a mão fechada e os dedos polegar e mindinho esticados balançando).
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